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ArtigosExplorando as implicações legais da responsabilidade penal dos menores inimputáveis: perspectivas sobre reformas no sistema jurídico

12/03/2024by admin0

Por Dayanne Avelar e Elisa Borges

 

 

No Brasil, a questão da menoridade penal remonta ao século XIX, com as Ordenações Filipinas de 1603, que já discutiam a responsabilidade criminal a partir dos sete anos de idade. Essa legislação vigorou até 1830, quando a idade mínima foi aumentada para quatorze anos com a promulgação do Código Criminal do Império do Brasil. No entanto, atualmente, a menoridade penal é regulamentada pela Constituição Federal de 1988, no artigo 228, que estabelece como penalmente inimputáveis os indivíduos menores de dezoito anos. Esses indivíduos são submetidos às normas da legislação especial, o que significa que não podem ser considerados responsáveis criminalmente, de acordo com a Carta Magna.

No entanto, à medida que a sociedade evoluiu, também aumentou a criminalidade, sendo cada vez mais evidente a participação de menores de dezoito anos, seja na prática de crimes ou através do incentivo de adultos. Isso ocorre devido à percepção de que esses menores, por serem inimputáveis, não serão responsabilizados penalmente por suas ações, mesmo que tenham consciência da ilicitude do que estão fazendo. Assim, observa-se uma contradição no ordenamento jurídico brasileiro em relação à maturidade desse grupo. Enquanto o Código Civil e Eleitoral garantem ao indivíduo com 16 anos de idade o exercício de sua cidadania, quando se trata do cometimento de um ato ilícito, esses mesmos indivíduos são vistos como incapazes de serem punidos pelo Código Penal. Isso se justifica pela alegação de que não possuíam discernimento no momento do ato, resultando em uma responsabilização através de medidas menos gravosas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

No que tange à maioridade penal, a legislação brasileira estabeleceu um limite de idade para a imputabilidade penal, fixando em 18 (dezoito) anos completos. Portanto, no âmbito da responsabilidade penal, os adolescentes e crianças são considerados legalmente inimputáveis, sendo punidos por meio de legislação especial e não pelo Código Penal.

É importante ressaltar que, no ordenamento jurídico brasileiro, os crimes e as contravenções penais só podem ser atribuídos, para efeitos da responsabilidade penal, às pessoas imputáveis. Se a conduta ilícita partir de uma criança ou adolescente, não será considerada crime ou contravenção, mas sim um ato infracional devido à ausência de culpabilidade e consequente punibilidade. Em outras palavras, o ato infracional cometido por crianças e adolescentes é punido com a aplicação das medidas socioeducativas e protetivas estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O objetivo é proteger e garantir seus direitos, proporcionando um tratamento individualizado e especial, mesmo quando praticam condutas tipificadas no Código Penal.

Durante o período colonial, o sistema legal era principalmente baseado nas Ordenações Filipinas, um conjunto de leis portuguesas que governavam o Brasil e estabeleciam punições para uma variedade de crimes. Com a independência em 1822, o Brasil começou a desenvolver sua própria legislação. O Código Criminal do Império de 1830 foi um dos primeiros códigos penais do Brasil independente, estabelecendo regras para a responsabilidade penal. Durante a República Velha (1889-1930), várias reformas legais foram promulgadas, incluindo o Código Penal de 1890, considerado um marco na evolução da responsabilidade penal no Brasil, ao estabelecer uma estrutura mais moderna inspirada em modelos europeus. O governo de Getúlio Vargas implementou uma série de reformas legislativas, incluindo a criação do Código Penal de 1940, que é a normativa em vigor até os dias de hoje. Este código manteve princípios de responsabilidade penal, incluindo a punição de crimes, embora tenha sido sujeito a várias emendas ao longo do tempo.

A condução das políticas públicas e da administração da justiça para a infância e juventude é regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei Federal 8.069, de 13 de julho de 1990. Esta data marca a promulgação da lei pelo Congresso Nacional, que, em seu teor, reflete a tradição da doutrina da proteção integral e representa uma ruptura com a antiga doutrina da situação irregular.

O ECA é uma legislação que busca abranger toda a população infantojuvenil, promovendo o respeito aos direitos de todos os meninos, meninas e jovens brasileiros. Seu propósito específico é regular todas as instâncias de participação e intervenção do Estado em questões que afetam os menores, incluindo situações em que um deles possa ser acusado de cometer um delito, abrangendo desde a fase de detenção até a execução das sanções determinadas pelo juiz, dentro do devido processo legal.

O ECA estabelece que todos os indivíduos menores de 18 anos são considerados inimputáveis criminalmente, o que implica que não podem ser responsabilizados legalmente pela prática de qualquer ato considerado ilícito. Em vez disso, as ações cometidas por menores são classificadas como atos infracionais. Quando o ato infracional é cometido por uma criança, podem ser aplicadas medidas protetivas, tais como orientação e apoio profissional temporário, obrigação de frequentar instituição de ensino básico, diagnóstico e tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, e acolhimento em instituição ou colocação em família substituta. O principal objetivo dessas medidas protetivas é reestruturar os laços familiares da criança, ao mesmo tempo em que garantem sua proteção e orientação.

No caso de um adolescente ser acusado de cometer um ato infracional, o ECA estabelece o que são conhecidas como medidas socioeducativas, com o objetivo de educar, ensinar e responsabilizar os jovens por suas ações. Para que essas medidas sejam aplicadas, é necessário comprovar a autoria do ato infrator, garantindo-se determinadas proteções processuais que garantam um devido processo legal. Através dessas garantias, busca-se promover um processo judicial mais eficiente e justo, independentemente da classe social do jovem, dando-lhe a oportunidade de se defender perante o juiz e assumir a responsabilidade pelos seus atos.

As medidas socioeducativas constituem a resposta da sociedade ao comportamento inadequado dos jovens. Elas incorporam um conteúdo socioeducativo que deve ser implementado com base em uma metodologia específica, terminologia, procedimentos, princípios e objetivos diferenciados daqueles utilizados nas sanções criminais aplicadas a adultos. Em outras palavras, embora tenham um caráter punitivo, as medidas socioeducativas têm como objetivo principal uma abordagem pedagógica. Elas visam permitir que o adolescente reflita mais profundamente sobre suas ações e, com o apoio dos profissionais responsáveis pelo acompanhamento de sua implementação, aborde os fatores que levaram à prática infracional específica.

Essas medidas também devem alcançar seu objetivo final, que é a ressocialização da criança ou adolescente na sociedade, promovendo uma consciência mais ampla de seus propósitos como membro da comunidade e fornecendo apoio à sua família. Em teoria, as medidas deveriam desencorajar a prática de atos infracionais, eliminar a sensação de impunidade e criar as condições para a reeducação dos jovens infratores, oferecendo-lhes os meios necessários para uma reintegração adequada na sociedade.

Atualmente, o processo de responsabilização de adolescentes é definido pela Justiça Juvenil Brasileira por meio de legislação específica, a Lei nº. 8.069/1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Este estatuto estabelece um novo paradigma de proteção integral, reconhecendo as crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos, considerando-os indivíduos em situação de desenvolvimento peculiar e com prioridade absoluta. Além disso, o ECA estipula as formas de responsabilização diante da prática de ato infracional, correspondente a infrações penais, através de medidas socioeducativas que variam desde uma simples advertência até a colocação em instituição educacional, priorizando o caráter pedagógico em sua aplicação sobre aspectos punitivos.

Portanto, compreende-se que as medidas socioeducativas são destinadas aos adolescentes que praticam atos infracionais, levando em conta a premissa de que estão em fase de desenvolvimento e, por isso, devem ser ressocializados ao invés de meramente punidos. Além disso, o ECA estabelece um conjunto de princípios orientadores para a aplicação dessas medidas, como o melhor interesse da criança e do adolescente, a brevidade da privação de liberdade, a individualização da responsabilidade e a prioridade absoluta na garantia de direitos. Tais princípios orientam o sistema de justiça e os órgãos responsáveis na tomada de decisões relacionadas aos casos de atos infracionais cometidos por jovens, assegurando que as medidas sejam proporcionais e adequadas às necessidades de cada adolescente, sempre com o objetivo de sua ressocialização e reintegração à sociedade.

Nesse sentido, o ECA estabelece as medidas de caráter reparador a serem aplicadas frente à ocorrência de atos infracionais:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I – advertência;

II – obrigação de reparar o dano;

III – prestação de serviços à comunidade;

IV – liberdade assistida;

V – inserção em regime de semi-liberdade;

VI – internação em estabelecimento educacional; […]

A autoridade responsável por aplicar as medidas dispostas no art. 112 da norma é o Juiz da Vara da Infância e Juventude, que analisará o grau de participação do menor, a gravidade do delito cometido e as consequências decorrentes dele, como aduz o §1° do referido artigo: “A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.”

Assim, as medidas socioeducativas e protetivas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, por serem constituídas por um viés pedagógico e além de meramente punitivo, representam um avanço significativo no âmbito dos direitos humanos, garantindo que a infância e a adolescência sejam períodos de crescimento saudável, desenvolvimento pleno e proteção eficaz. Ao mesmo tempo, essas medidas visam à construção de uma sociedade mais justa e responsável, onde todos tenham a oportunidade de se tornarem cidadãos participativos e realizados.

Um dos princípios fundamentais do direito penal estipula que uma pessoa só pode ser considerada culpada e, consequentemente, punida, se tiver a capacidade de compreender a ilicitude de seus atos e agir com culpa. A inimputabilidade reconhece que, em determinadas circunstâncias, essa capacidade está comprometida a ponto de justificar a isenção de responsabilidade criminal. A imputabilidade é um dos princípios essenciais do sistema penal contemporâneo, pois o direito de punir alguém por um crime está intrinsecamente ligado à sua capacidade de compreender a natureza criminosa de sua conduta. Em termos simples, uma pessoa só pode ser responsabilizada criminalmente se possuir a capacidade mental adequada para entender suas ações e controlá-las conforme estabelecido pela lei.

No Direito Penal brasileiro, a imputabilidade é categorizada em três condições. Os imputáveis são aqueles que possuem plena capacidade de autodeterminação e compreensão do que é lícito e ilícito, sendo responsáveis pelos crimes que cometem. Em seguida, temos os semi-imputáveis, que podem ou não apresentar alguma patologia, e sua imputabilidade é avaliada com base na capacidade de autodeterminação no momento do crime. Por fim, os inimputáveis são aqueles que não possuem capacidade de autodeterminação devido a patologias ou questões de idade. Tanto os semi-imputáveis quanto os inimputáveis recebem medidas de segurança, que incluem tratamento para patologias, enquanto os menores de idade recebem medidas socioeducativas com propósito pedagógico e ressocializador, em vez de penas.

Portanto, ao discutir a menoridade penal, é crucial compreender os elementos constitutivos do crime, adotados pelo ordenamento jurídico brasileiro por meio da teoria tripartite, na qual o crime é caracterizado como um fato típico, ilícito e culpável, sendo esses elementos interconectados. Dessa forma, no caso de menores infratores, é essencial considerar o terceiro elemento analítico do crime, que é a culpabilidade, estreitamente relacionada à imputabilidade. Em outras palavras, mesmo que um menor infrator entenda que sua conduta é ilegal, a lei presume que esse indivíduo não possui o discernimento necessário para compreender plenamente suas ações. Isso está alinhado com o entendimento do sistema jurídico, que considera os menores de dezoito anos como incapazes de serem responsabilizados criminalmente pelo Direito Penal.

De acordo com as leis brasileiras, a menoridade penal é estabelecida pelo artigo 228 da Constituição Federal e pelo artigo 27 do Código Penal, fixando a idade em 18 anos. Com isso, nenhuma pessoa que tenha menos de 18 anos de idade pode ser acusado criminalmente, nem se submete às regras estabelecidas no Código Penal Brasileiro, por serem considerados inimputáveis.

No entanto, o ECA reconhece que pessoas acima dos 12 anos são consideradas adolescentes. Analisando as disposições normativas tem-se que:

  • Considera-se criança aquele que tem até 12 anos incompletos;
  • Considera-se adolescente a pessoa entre 12 e 18 anos;
  • A pessoa com mais de 18 anos é adulta e responsável por todos os atos da vida civil, podendo ser responsabilizada também na esfera penal.

Isso implica que menores com menos de 12 anos não podem ser responsabilizados criminalmente, independentemente da gravidade do delito cometido. Contudo, é relevante salientar que os menores entre 12 e 18 anos estão sujeitos ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê medidas socioeducativas em substituição às penas restritivas de liberdade e direito dispostas no Código Penal. Como demonstrado anteriormente, essas medidas às quais os adolescentes estão sujeitos têm como objetivo a reintegração do jovem infrator à sociedade, visando sua ressocialização.

Considerando que menores de 18 anos são inimputáveis perante a Lei e o grande volume de aliciamento de jovens ao crime organizado, atualmente, há discussões em curso sobre a possibilidade de redução da maioridade penal no Brasil. No entanto, qualquer modificação nesse critério exigiria alterações na Constituição ou na legislação penal.

Essa discussão suscita uma série de questões complexas que abrangem direitos humanos, justiça, prevenção do crime e reforma do sistema prisional. Muitos argumentam que tratar menores de 18 anos como adultos no sistema de justiça penal viola os direitos humanos, uma vez que os adolescentes ainda estão em fase de desenvolvimento e podem ser mais facilmente reabilitados do que adultos. Além disso, a detenção de jovens em ambientes prisionais com adultos pode expô-los a influências negativas, aumentando a probabilidade de envolvimento em comportamento criminoso no futuro.

Outra objeção à redução da maioridade penal é a falta de infraestrutura adequada para lidar com jovens infratores no sistema prisional. As prisões brasileiras já sofrem com sérios problemas de superlotação, violência e condições precárias. Inserir jovens nesse ambiente pode agravar ainda mais esses problemas e não oferecer o contexto adequado para a reabilitação e reintegração na sociedade.

Ao invés de propor a redução da maioridade penal, há argumentos que sugerem que o foco deve ser direcionado para a reforma do sistema de justiça juvenil e o investimento em programas de prevenção ao crime. Isso implica em aprimorar a educação, garantir acesso a serviços de saúde mental e promover atividades extracurriculares que mantenham os jovens ocupados e distantes do envolvimento com o crime. Além disso, a ênfase na reabilitação e na reintegração na sociedade é crucial para evitar que jovens infratores persistam no ciclo criminal.

Por outro lado, alguns juristas afirmam que menores de 18 anos, a depender da idade, têm plena capacidade de compreenderem e se responsabilizarem por seus atos. Nessa vertente, a pessoa menor deve saber a distinção do certo e o errado, e as decisões são tomadas por vontade própria, inexistindo coação de pessoa imputável e culpa exclusiva deste sobre os delitos praticados pelo menor.

Nesse sentido, a corrente defensora da tese entende que os direitos assegurados aos adolescentes que cometem atos infracionais se sobrepõem ao direito coletivo à segurança, garantido pela Carta Magna. Que por isso, a redução da maioridade penal seria um meio de garantir a efetiva punição daquele que por seus próprios atos e omissões e com plena consciência dos mesmos agiu de forma contrária aos valores e direitos sociais garantidos pela legislação.

O jurista Guilherme de Souza Nucci explica que a redução da maioridade penal deveria se dar pelo simples reconhecimento da capacidade cognitiva de entender os delitos que praticam as pessoas maiores de 16 anos:

Não é admissível acreditar que menores entre 16 anos ou 17 anos, não tenham condições de compreender o caráter ilícito do que praticam, tendo em vista que o desenvolvimento mental acompanha, como é natural, a evolução dos tempos. (NUCCI, 2007, p. 294 apud DA SILVA, 2019, p. 41)

Nesse sentido, é necessário também entender os aspectos da vida civil que engajam e abarcam pessoas maiores de dezesseis anos como sujeitos de direito, relativamente capazes de realizar atos por seu próprio desígnio.

No Código Civil Brasileiro, em seu artigo 4°, considera-se que pessoas maiores de dezesseis anos e menores de dezoito são relativamente capazes, ou seja, podem, por si próprios, praticar determinados atos da vida civil da mesma maneira que pessoas plenamente capazes, como declarar o nascimento do próprio filho. Ainda na esfera civil, o menor relativamente incapaz responde diretamente pelas obrigações assumidas por ele desassistido, sem poder alegar a ausência de representação para se exaurir de cumprir as obrigações que lhe foram incumbidas por si mesmo.

Da mesma maneira, o direito eleitoral consolida que adolescentes acima dos dezesseis anos possuem capacidade intelectual e conhecimento fenomenológico suficiente para escolher os líderes que guiarão o país. Neste tocante, surge o entendimento de que se esses adolescentes possuem capacidade cognitiva para votar e exercer por si próprios diversos atos da vida civil, deveriam também ser considerados suficientemente avançados de idade para responder por seus crimes.

Além disso, a defesa da redução da maioridade penal também engloba o fato de que muitos adolescentes possuem a expertise de realizar escolhas determinantes para o próprio futuro, como o ingresso à instituições de ensino superior e inserção no mercado de trabalho.

A corrente que defende a redução da maioridade penal considera que nos tempos atuais, com uma ampla diversidade tecnológica, o aumento da violência no Brasil e a recorrência de pessoas jovens no crime, o desenvolvimento intelectual dos adolescentes é muito mais avançado do que o dos jovens à época da formulação do Código Penal e da Constituição, entendendo, portanto, que os dispositivos que regulam as ações infracionais das pessoas menores de dezoito anos não mais reflete a realidade da capacidade de discernimento da juventude brasileira. A maturidade que os adolescentes do século XXI têm diante da facilidade de acesso à informações e os avanços comunicativos e educacionais é discrepante em relação aos jovens dos anos passados, que eram, em sua maioria, alheios à política e às leis, por exemplo.

Além disso, ainda há quem defenda que a maioridade penal deveria ser reduzida para 14 anos, não 16. Essa vertente afirma que nos dias atuais adolescentes dessa idade já possuem entendimento e plena consciência das próprias ações, não sendo razoável a regra que os tornam inimputáveis perante à legislação penal.

No mesmo sentido, frisa-se que as medidas socioeducativas muitas vezes se mostram infrutíferas e insuficientes para garantir o bem estar social. Inclusive, muito se fala sobre a injustiça na aplicação das medidas dispostas no ECA, de modo que possam até estimular menores a praticarem atos infracionais. Esse “estímulo”, ou ausência de medidas efetivas no combate ao crime e à violência, são o que proporcionam aos mandantes e responsáveis o aliciamento desses menores para a prática de pequenos delitos ou recrutamento ao crime organizado. Muito se vê grandes autores do crime influenciarem a juventude, principalmente periférica, a se disponibilizar para participar de transgressões e violações normativas. Além disso, também é extremamente comum a convocação de jovens e adolescentes para realização do “trabalho sujo” das organizações criminosas.

Portanto, a discussão acerca da redução ou não da maioridade penal enfrenta a dualidade entre manutenção da segurança social contra a necessidade de educação e ressocialização do jovem infrator, que pode, a depender do seu nível intelectual, ser incapaz de distinguir e saber das consequências das próprias ações.

No entanto, refletindo sobre a realidade socioeconômica do país, não é possível afirmar que os adolescentes, distribuídos apenas por idade, podem ser considerados equivalentes no que tange à capacidade cognitiva e discernimento sobre as próprias ações. Frente à marginalização, à falta de acesso efetivo à educação e o crescimento da desigualdade, não se pode comparar o intelecto e conhecimento fenomenológico de um jovem criado na favela, sem qualquer amparo, apoio ou estudo político-social; ao de um jovem que teve acesso à tudo que lhe era possível e que viveu verdadeiramente livre a vida inteira.

Nas Varas da Infância ou Juventude, as ocorrências mais comuns são cometidas por jovens que não tinham o discernimento que jovens mais privilegiados possuem. É certo que, com o avanço das tecnologias e dos meios de comunicação, as pessoas têm muito mais meios de saber e conhecer o mundo, inclusive entender as distinções entre o que é certo e deve ser feito, e o que configura uma violação de um direito.

Apesar de reconhecer a geração atual como a que mais tem acesso à informação, ainda não é possível equiparar todos os adolescentes de mesma idade como possuidores do mesmo entendimento da estrutura do Estado e suas regulamentações. Os problemas de desigualdade econômica, social e racial são fatores determinantes nas políticas de manutenção da ordem social, e devem ser considerados na determinação ou não da redução da maioridade penal.

A abordagem atual, prevista pelo ECA, busca promover a reabilitação dos jovens infratores através de uma corrente pedagógica. As propostas de reforma que visam a responsabilização penal, baseadas num viés punitivo dos atos praticados, devem considerar os fatores que contribuem para a delinquência dos adolescentes. A inserção de jovens delinquentes ao sistema carcerário existente não seria capaz de sancioná-los da maneira devida, visto que as prisões são ambientes extremamente violentos e pouco educativos, o que dificultaria a reabilitação e o retorno do jovem à vida social. Por outro lado, por muitas vezes as medidas impostas não são suficientes para proteger o bem-estar social.

Por fim, os legisladores recorrentemente discutem sobre o tema. O debate em torno das implicações legais da responsabilidade penal dos menores inimputáveis reflete uma interseção complexa entre considerações jurídicas, sociais e éticas. As diferentes perspectivas sobre a reforma na legislação para redução ou não da maioridade penal evidenciam a necessidade de um equilíbrio entre a proteção dos direitos das crianças e adolescentes e a garantia da segurança pública.

Em última análise, a abordagem da redução da maioridade penal deve ser guiada pela sensatez e pela empatia. É crucial encontrar um equilíbrio entre responsabilizar os menores infratores e garantir que eles tenham a chance de se reabilitar e se reintegrar à sociedade. Em vez de simplesmente reduzir a idade da imputabilidade, é necessário buscar soluções mais abrangentes que considerem a complexidade desse problema e busquem promover uma sociedade mais justa e segura para todos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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