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ArtigosEmbargos de Declaração no Processo Civil: da omissão, da obscuridade, da contradição e do erro material

Os embargos de declaração são um recurso previsto entre os arts. 1.022 e 1.026 do Código de Processo Civil – CPC, que visa “o esclarecimento ou a integração da decisão recorrida, tornando-a mais clara, mais coesa e mais completa” (BUENO, 2023. Pág.: 369).

Conforme dispõe o art. 1.022 do CPC:

Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:

I – esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II – suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;

III – corrigir erro material.

Nos moldes do art. 1.023 do CPC, os embargos declaratórios não estão sujeitos ao recolhimento de custas processuais, diferentemente dos demais recursos previstos no diploma processual, e devem ser opostos no prazo de cinco com a indicação do elemento guerreado na decisão embargada. No mais, a oposição dos embargos de declaração exige que a apresentação da omissão, da contradição, da obscuridade ou do erro material seja feita de forma transparente e precisa.

A omissão ocorre quando o órgão jurisdicional deixa de considerar algo que teria que ser ponderado. Nesse sentido, o Parágrafo Único, do art. 1.022, do CPC, prevê situações em que será omissa a decisão que: deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento, e/ou incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º, do CPC, quais sejam:

Art. 489. Omissis

§1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

Sem afastar a profundidade que cada um dos incisos acima, as situações acima são autoexplicativas, usualmente por tratar de hipóteses de fundamentação referencial ou de explícita violação ao princípio da motivação das decisões judiciais (art. 11, CPC, e art. 93, inc. IX, CF).

De todo modo, importa mencionar que é comum encontrar em muitos precedentes do Superior Tribunal de Justiça – STJ que “não é o órgão julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa da tese que apresentaram” (REsp n. 1.656.361/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/10/2018, DJe de 22/4/2019). Assim, nos casos em que se opõe embargos declaratórios com fulcro no inc. IV, do § 1º, do art. 489 combinado com o inc. II, do Parágrafo Único, do art. 1.022, ambos do CPC, deve-se apontar com clareza os motivos pelos quais os argumentos não rebatidos são capazes de infirmar a conclusão adotada.

Noutro giro, a decisão obscura é compreendida como aquela em que falta clareza na prestação jurisdicional, caracterizada por eventual ambiguidade, vício de linguagem ou, até mesmo, deficiência nos meios de expressão “capaz de despertar a dúvida no espírito do leitor” (GONÇALVES, 2023. Pág.: 363). A contradição, por sua vez, é entendida como sendo a falta de coerência da decisão, isto é, quando os elementos contidos no provimento jurisdicional se contradizem ou o próprio dispositivo é inconciliável aos fundamentos empregados. Aliás, em face da antítese impedir a compreensão da decisão embargada: “Pode-se dizer que uma decisão que contenha contradições é também obscura, porque aquilo que não tem coerência não pode ser tido por claro” (GONÇALVES, 2023. Pág.: 363).

Quanto ao último elemento, não sendo uma considerada inobservância das normas processuais (erro in procedendo) ou falhas no julgamento (erro in iudicando), o erro material compreende a “dissonância flagrante entre a vontade do julgador e a sua exteriorização; num defeito mínimo de expressão, que não interfere no julgamento da causa e na ideia nele veiculada (por exemplo, 2 + 2 = 5)” (BONDIOLI, 2015, Pág.: 153 apud JÚNIOR, 2021. Pág.: 956). Logo, o erro material visa corrigir erro manifesto, visível e facilmente verificável.

Diante da importância dos embargos declaratórios, o art. 1.025 do CPC prevê: “Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.

É importante enfatizar que o pré-questionamento exige que “o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”, ou seja, serão incluídos os elementos que os tribunais superiores reconhecerem característicos dos embargos e que não foram devidamente analisados pelo órgão julgador a partir do referido recurso.

Nesse parecer, veja o Enunciado da Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal – STF: “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento”. Do mesmo modo, confira o seguinte trecho dos EDcl no AgInt no AREsp n. 2.222.062/DF:

[…] Para que o art. 1.025 do CPC/2015 seja aplicado, e permita-se o conhecimento das alegações da parte recorrente, é necessário não só que haja a oposição dos embargos de declaração na Corte de origem (e. 211/STJ) e indicação de violação do art. 1.022 do CPC/2015, no recurso especial (REsp n. 1.764.914/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8/11/2018, DJe 23/11/2018). A matéria deve ser: i) alegada nos embargos de declaração opostos (AgInt no REsp n. 1.443.520/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 1º/4/2019, DJe 10/4/2019); ii) devolvida a julgamento ao Tribunal a quo (AgRg no REsp n. 1.459.940/SP, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 24/5/2016, DJe 2/6/2016) e; iii) relevante e pertinente com a matéria (AgInt no AREsp n. 1.433.961/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 17/9/2019, DJe 24/9/2019.) […] (EDcl no AgInt no AREsp n. 2.222.062/DF, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 21/8/2023, DJe de 23/8/2023.)

Ademais, nos moldes do art. 1.026 do CPC, apesar de não terem efeito suspensivo, os embargos de declaração podem sim suspender os efeitos da decisão embargada caso seja devidamente “demonstrada a probabilidade de provimento do recurso ou, sendo relevante a fundamentação, se houver risco de dano grave ou de difícil reparação”, e também possuem efeito interruptivo para os prazos recursais. Desse modo, o prazo para a interposição de outro recurso cabível, a exemplo da apelação (art. 1.009, CPC) ou do agravo de instrumento (art. 1.015, CPC), é interrompido enquanto os embargos são analisados pelo órgão jurisdicional.

De todo modo, a interrupção dos prazos recursais não é absoluta.

Os embargos de declaração, como espécie de recurso, procedem do preenchimento de pressupostos, por exemplo, cabimento, legitimidade, tempestividade e interesse processual. Por isso, “os embargos de declaração opostos em desfavor da decisão que inadmitiu o recurso especial não são o recurso adequado ou cabível à espécie” (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.391.873/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 29/11/2023). Isso porque, nas palavras da Ministra Assusete Magalhães:

[…] o Recurso Especial, apesar de preencher os requisitos de admissibilidade formais e de apontar contrariedade à Lei ou divergência jurisprudencial, pode, ainda assim, deixar de ser admitido pelos Tribunais de origem.

Esse juízo prévio de admissibilidade, todavia, não possui efeito vinculante, porquanto “efetivamente, compete ao Superior Tribunal de Justiça proceder, em caráter definitivo, ao juízo de admissibilidade do recurso especial, assim como atribuir-lhe, excepcionalmente, efeito suspensivo”. A Corte a quo, ao desempenhar tais atribuições, o faz na condição de delegatário deste Tribunal Superior, razão pela qual os comandos, nessa condição exarados, revelam-se efêmeros (pendentes de ratificação por esta Corte, portanto) (STJ, AgRg na MC 20.733/GO, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DJe de 21/10/2014).

O Superior Tribunal de Justiça tem reiterado esse entendimento, na vigência do CPC/2015, no sentido de que “o juízo de admissibilidade é bifásico, ou seja, o primeiro juízo realizado no Tribunal de origem não tem o condão de vincular a decisão de admissibilidade do STJ, que é soberana à daquele” (STJ, AgInt no AREsp 1.080.807/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, DJe de 05/10/2017).

De fato, o exame feito, no Tribunal de origem, sobre a admissibilidade do Recurso Especial, é apenas uma das etapas a que é submetido o apelo derradeiro, cabendo tão somente ao STJ a sua apreciação final. Tanto assim o é, que contra a decisão que inadmite o Recurso Especial, não só o CPC/73 (art. 544), como o CPC vigente (art. 1.042), dispõem que cabe Agravo para o STJ. […] (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.131.549/RJ, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 4/12/2023, DJe de 11/12/2023. p. 8).

Por outro lado, em face do enunciado da Súmula 182 do STJ: “É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada”, os embargos de declaração podem sim ser opostos contra decisão de admissibilidade de recursos “quando o tribunal local adota fundamentação genérica, inviabilizando a interposição do respectivo agravo” (AgInt no AREsp n. 1.599.563/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 25/10/2021, DJe de 3/11/2021).

A ausência de outras condições também pode obstar o efeito suspensivo. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 2.017.642/MG, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 16/10/2023, DJe de 18/10/2023; AgRg no AREsp n. 1.926.238/MG, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 17/12/2021; e AgInt no AREsp n. 1.250.886/RN, relator Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), Quarta Turma, julgado em 20/9/2018, DJe de 27/9/2018 e etc.

Quanto aos chamados efeitos infringentes, regressivos ou modificativos, o professor Cassio Scarpinella Bueno esclarece que:

A causa dos declaratórios nunca é o reexame da decisão, embora ele possa ocorrer como consequência de seu provimento, quando há situação de incompatibilidade entre o seu acolhimento e a decisão embargada. O pedido principal dos declaratórios é, por definição, o de ser saneada a obscuridade ou a contradição, suprida a omissão ou corrigido o erro material. O eventual rejulgamento, com a modificação da decisão embargada, é, apenas e tão somente, circunstancial, verdadeiro pedido sucessivo, no sentido de ele só poder ser apreciado se o pedido principal for acolhido; nunca o inverso. Nos casos em que o embargante pretende o reexame da decisão, e não nos que há afirmação de obscuridade, contradição, omissão ou erro material, os declaratórios devem ser rejeitados de plano, isto é, não conhecidos, à falta de seus pressupostos típicos de cabimento. (BUENO, Cassio S. Curso sistematizado de direito processual civil: procedimento comum, processos nos tribunais e recursos. v.2. São Paulo: Editora Saraiva, 2023. Pág.: 373).

Aliás, a possibilidade de os embargos de declaração modificarem a decisão guerreada está prevista no §4º, do art. 1.024, do CPC, exigindo, todavia, que os mesmos sejam acolhidos:

Art. 1.024. Omissis

§4º Caso o acolhimento dos embargos de declaração implique modificação da decisão embargada, o embargado que já tiver interposto outro recurso contra a decisão originária tem o direito de complementar ou alterar suas razões, nos exatos limites da modificação, no prazo de 15 (quinze) dias, contado da intimação da decisão dos embargos de declaração.

Significa dizer que embora são sejam próprios de reformar a decisão recorrida, os embargos declaratórios podem sim modificar o conteúdo do provimento jurisdicional de tal forma que seja necessário complementar ou, até mesmo, alterar os fundamentos empregados antes da sua análise.

Por fim, ressalta-se que “Quando manifestamente protelatórios os embargos de declaração, o juiz ou o tribunal, em decisão fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a dois por cento sobre o valor atualizado da causa”, nos moldes do §2º do art. 1.026 do CPC. Ainda, no parágrafo seguinte é advertido que: “Na reiteração de embargos de declaração manifestamente protelatórios, a multa será elevada a até dez por cento sobre o valor atualizado da causa, e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa, salvo opostos pela Fazenda Pública ou pelo beneficiário da justiça gratuita, que a recolherão ao final do processo.

Caso a imposição das multas não seja suficiente para evitar novos embaraços à efetivação da decisão, o §4º do art. 1.026 do CPC prevê “Não serão admitidos novos embargos de declaração se os 2 (dois) anteriores houverem sido considerados protelatórios”.

Diante da breve análise acima, os embargos declaratórios servem como uma forma célere, objetiva e precisa de esclarecer determinado ponto da decisão jurisdicional ou, se for caso, integrá-la de modo que, ainda, é possível modificar o seu conteúdo. De qualquer maneira, a oposição do recurso deve ser feita de forma transparente e com boa-fé, vez que a essência da norma exige que os embargos sejam utilizados corretamente, a fim de engrandecer a prestação jurisdicional, sob pena de multa nos casos que visem meramente protelar o processo e, assim, prejudicar o mecanismo da justiça.

 

BUENO, Cassio S. Curso sistematizado de direito processual civil: procedimento comum, processos nos tribunais e recursos. v.2. São Paulo: Editora Saraiva, 2023.

GONÇALVES, Marcus Vinicius R. Curso de Direito Processual Civil: Execução, Processos nos Tribunais e Meios de Impugnação das Decisões. v.3. São Paulo: Editora Saraiva, 2023.

BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Novidades em matéria de embargos de declaração no CPC de 2015. Revista do Advogado, São Paulo, n. 126, maio de 2015.

JÚNIOR, Humberto T. Curso de Direito Processual Civil – Vol. 3. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021.

EDcl no AgInt no AREsp n. 2.222.062/DF, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 21/8/2023, DJe de 23/8/2023.

AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.391.873/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 27/11/2023, DJe de 29/11/2023)

AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.131.549/RJ, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 4/12/2023, DJe de 11/12/2023

AgInt no AREsp n. 1.599.563/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 25/10/2021, DJe de 3/11/2021.

AgInt no REsp n. 2.017.642/MG, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 16/10/2023, DJe de 18/10/2023.

AgRg no AREsp n. 1.926.238/MG, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 17/12/2021.

AgInt no AREsp n. 1.250.886/RN, relator Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), Quarta Turma, julgado em 20/9/2018, DJe de 27/9/2018.

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