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ArtigosA incidência da inimputabilidade penal na Lei de Drogas

Como já é sabido, a responsabilidade penal do indivíduo é a consequência da prática de um fato típico e ilícito. Todavia, o ordenamento jurídico brasileiro traz hipóteses para balizar as consequências da imputabilidade penal, conforme a sua culpabilidade.

A chamada culpabilidade é encontrada no sistema finalista da conceitualização do crime, precisamente, no conceito tripartido, para qual o fato é típico, ilícito e culpável. Ou seja, trata-se de um juízo de reprovabilidade que incide sobre a formação e exteriorização da vontade, e repercute sobre a pena da pessoa. (MASSON, 2020, p. 375 – 376)

A imputabilidade, embora não seja definida pelo Código Penal Brasileiro, é um dos elementos da culpabilidade, e nos termos dos artigos 26 ao 28, do mesmo, relaciona-se a capacidade mental do indivíduo no momento da conduta delitiva ao discernir acerca da ilicitude de fato. (MASSON, 2020, p. 385)

Assim, enaltecem-se dois elementos, os quais são definidos pelo jurista Cleber Masson da seguinte forma:

“Intelectivo: é a integridade biopsíquica, consistente na perfeita saúde mental que permite ao indivíduo o entendimento do caráter ilícito do fato; e, volitivo: é o domínio da vontade, é dizer, o agente controla e comanda seus impulsos relativos à compreensão do caráter ilícito fato, determinando-se de acordo com esse entendimento.” (MASSON, 2020, p. 385)

 

Em outras palavras, para ser caracterizada a imputabilidade do sujeito, no momento da ação ou omissão, devem se fazer presentes os elementos em apreço, senão ocorrerá a exclusão da culpabilidade, ante a inimputável. Inclusive, a caráter de curiosidade, presume-se a imputabilidade em seu critério cronológico, que é ao completar 18 anos de idade.

Quanto à inimputabilidade, a legislação criminal expõe:

Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento

        Parágrafo único – A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 

Posto isso, aquele que no momento do ato antijurídico não possuía capacidade cognitiva plena é isento de pena, contudo, convém lembrar que o Código Penal é claro quanto a inimputabilidade e condições mentais supervenientes não importam, somente suspendem o processo.

Por conseguinte, a Lei 11.343, de 2006, valendo-se do sistema biopsicológico adotado pelo Código Penal e e com base nas consequências punitivas no tocante a embriaguez, estabeleceu questões de inimputabilidade.

A embriaguez é tratada de formas distintas pelo ordenamento, tendo em vista as suas circunstâncias, mas somente a embriaguez em decorrência de caso fortuito ou por força maior, se completa, tem o condão de excluir a culpabilidade. Ou seja,  quem, apesar não possuir problema mental, não tinha discernimento no momento dos fatos nem estava “bêbado” voluntariamente.

Neste diapasão, a Lei de Drogas:

Art. 45. É isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Destarte, incide-se ao sujeito subordinado aos efeitos de substâncias entorpecentes a inimputabilidade penal, que quer dizer a possibilidade de absolvição. É valido mencionar, ainda, que o dispositivo apresenta duas hipóteses: a) em razão de caso fortuito ou força maior, a qual o sujeito glosará da absolvição própria; e b) por motivo de dependência, terá a absolvição imprópria, sendo submetido a tratamento curativo inerente à medida de segurança.

No tocante a segunda situação, opera-se a teoria da actio libera in causa, pois tem que se atentar a questões relativas à intenção do agente, do porquê ele está nessas condições, justificando eventual punição no tempo do estado de consciência. Isto é, a pessoa usou entorpecente por causa de sua dependência, ou para praticar um outro fato delituoso. (MASSON, 2022, p. 404)

Consoante ao apresentado, é imperioso destacar um acórdão do TJDFT:

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ART. 12 DA LEI 6.368/1976. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE USO DE ENTORPECENTES, PREVISTO NO ART. 16 DO MESMO DIPLOMA LEGAL. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PUGNANDO PELA CONDENAÇÃO POR TRÁFICO DE DROGAS. EXISTÊNCIA DE LAUDO PERICIAL EM APENSO ATESTANDO QUE O RÉU ERA INTEIRAMENTE INCAPAZ DE ENTENDER O CARÁTER ILÍCITO DA AÇÃO E DE DETERMINAR-SE DE ACORDO COM ESSE ENTENDIMENTO. INIMPUTABILIDADE. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO.

0071271-03.2000.8.07.0001 – 2ª Turma Criminal. Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI. Publicado no DJE : 16/06/2010 . Pág.: 166

Em síntese, é evidente a exclusão da ilicitude em crimes praticados quando o agente estava sob efeito de droga, mas a problemática da questão reside na comprovação, por perícia, de que o agente no momento da conduta era inteiramente incapaz de entender a ilicitude, requisito presente no art. 45, parágrafo único da Lei supracitada.

Assim como no Código, a Lei 11.343 também prevê a possibilidade de redução de pena, que Cezar Bittencourt denominada como “culpabilidade diminuída”, logo “o agente não possui a “plena capacidade” de entender a ilicitude do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.” (2007, v.1, p. 356)

Vislumbra-se, consequentemente, na semi-imputabilidade, uma causa obrigatória de diminuição de pena, que ocorre se apresentado laudo comprovando que a pessoa agiu sob efeito de entorpecente, no momento da conduta, e houve o comprometimento da censurabilidade da conduta ilícita. Neste sentido, segue artigo de lei:

Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Ainda, cabe ilustrar o direito de diminuição apresentado por meio da jurisprudência:

RECURSOS DE APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI 11.343/2006 E ARTIGO 306, § 1º, DA LEI Nº 9.503/1997. APREENSÃO DE 511,87G DE “MACONHA”, 12G DE “COCAÍNA” E 8,25G DE CRACK. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA PORTE DE DROGAS PARA USO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DO CRIME DE TRÁFICO COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. QUANTIDADE E VARIEDADE DE DROGAS. CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DO ARTIGO 46 E DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. INVIABILIDADE. MANUTENÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO PARA O CRIME DE TRÁFICO. RÉU REINCIDENTE. ALTERAÇÃO DO REGIME IMPOSTO AO CRIME DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. PENA DE DETENÇÃO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. INVIABILIDADE. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PERDIMENTO DO VEÍCULO. VIABILIDADE. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO DA DEFESA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

TJDFT – 0009369-53.2017.8.07.0001 – Res. 65 CNJ. 2ª TURMA CRIMINAL. Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI. Publicado no DJE : 03/09/2019 . Pág.: 130/137

 

Portanto, imprescindível a comprovação da incapacidade de entendimento e de autodeterminação do autor do fato criminoso, a fim de obtenção da isenção da pena ou eventual redução. Cabe também destacar, que é direito do réu, competindo ao magistrado apenas a discricionariedade em relação ao quantum a ser diminuído. A exceção ao instituto, é a conduta do art. 28, da Lei de Drogas, que trata do consumo pessoal de entorpecentes.

 

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MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – v. 1 / Cleber Masson. – 14. Ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020.

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. Parte Geral. v.1. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

BRASIL. Tribunal do Distrito Federal e Territórios. Jurisprudência em Temas. Imputabilidade. Lei 11.343/2006. 2022. Disponível em: < https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/a-doutrina-na-pratica/imputabilidade/lei-11-343-2006 >.Acesso em: 14 de fevereiro de 2024.

BRASIL. Código Penal. Brasília, DF: Presidência da República, 1984. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm > Acesso em: 14 de fevereiro de 2024.

BRASIL. Lei 11.343/2006. Brasília, DF: Presidência da República, 2006. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm > Acesso em: 14 de fevereiro de 2024.

 

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