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ArtigosA atribuição de responsabilidade civil por danos ambientais nas empresas

O Direito Ambiental, ramo do direito público que visa a proteção do meio ambiente, tem como objetivo garantir a qualidade de vida para as presentes e futuras gerações, sendo responsável por lidar e regulamentar questões relacionadas ao meio ambiente, recursos naturais e regulamentações governamentais. Como se fundamenta em princípios como a precaução e a sustentabilidade, a área jurídica está intrinsecamente ligada ao direito empresarial, uma vez que as corporações são as maiores causadoras de danos ao meio ambiente.

Com a globalização e o crescente desenvolvimento das grandes indústrias, cada vez mais a preocupação com a preservação ambiental tem sido pauta no direito e na política internacional. Os receios e nuances que englobam o tema têm levado a uma análise rigorosa dos desafios enfrentados na busca por meios sustentáveis de produção, incluindo a responsabilização corporativa por danos ambientais causados por grandes empresas e complexos industriais.

A crescente degradação ambiental impulsiona a necessidade de responsabilizar as empresas por seus impactos negativos no meio ambiente. Apesar de leis e regulamentações existirem, há uma gama de desafios legais na implementação de medidas práticas voltadas para a sustentabilidade.

Esse cenário envolve uma série de questões éticas, jurídicas e econômicas, pois, diante dos atuais problemas, como crises climáticas, poluição das águas e do solo, surgiu a preocupação sobre o futuro da humanidade. Considerando que os danos ambientais representam uma ameaça significativa à biodiversidade e ao equilíbrio ecossistêmico, o direito ambiental se apresenta como um fator determinante para a garantia da existência de um mundo saudável para as gerações futuras.

A degradação do meio ambiente resultante de práticas industriais inadequadas, poluição e extração irresponsável de recursos naturais destaca a urgência em abordar essas questões de maneira eficaz. Tendo em vista a dualidade entre avanços econômicos e tecnológicos e a proteção ambiental, é cada vez mais urgente a adoção de práticas de desenvolvimento sustentável, de forma a promover benefícios para ambos os aspectos.

Assim, destaca-se a necessidade de um enfoque abrangente para abordar os impactos negativos das atividades empresariais no meio ambiente. Nesse contexto, a responsabilização corporativa refere-se à exigência de que as empresas assumam as consequências de suas ações, reconhecendo seu papel fundamental na busca por soluções sustentáveis, medida que assegura que as empresas sejam responsáveis por mitigar, compensar e prevenir tais impactos adversos.

Ocorre que em muitos casos, a complexidade dessa discussão é evidenciada pelos desafios legais associados. Apesar da existência de dispositivos normativos que regulam as ações empresariais e prevejam as formas de responsabilização civil e penal dos entes responsáveis, há diversas lacunas que prejudicam a interpretação e implementação das normas na prática.

A Lei n° 6.938 estabelece em seu artigo 5°:

Art 5º – As diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente serão formuladas em normas e planos, destinados a orientar a ação dos Governos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios no que se relaciona com a preservação da qualidade ambiental e manutenção do equilíbrio ecológico, observados os princípios estabelecidos no art. 2º desta Lei.

Parágrafo único – As atividades empresariais públicas ou privadas serão exercidas em consonância com as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente.

Além disso, o Brasil também possui algumas instituições responsáveis pela proteção da fauna e da flora brasileira, como o IBAMA e o ICMBio, vinculados ao Ministério do Meio Ambiente; e diversas Organizações Não Governamentais, que desenvolvem projetos para promover o desenvolvimento sustentável, educação social e cuidado com a natureza, como o SOS Mata Atlântica, Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) e o Institutos de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).

Também, a Lei n° 12.651estabelece alguns territórios voltados à conservação ambiental, como as Áreas de Preservação Permanente (APPs), Reservas Legais e Unidades de Conservação, que possuem algumas restrições quanto ao uso e exploração. A referida norma traz alguns princípios para a proteção da vegetação nativa brasileira, como:

Art 1°-A […]

Parágrafo único. Tendo como objetivo o desenvolvimento sustentável, esta Lei atenderá aos seguintes princípios:

[…]

II – reafirmação da importância da função estratégica da atividade agropecuária e do papel das florestas e demais formas de vegetação nativa na sustentabilidade, no crescimento econômico, na melhoria da qualidade de vida da população brasileira e na presença do País nos mercados nacional e internacional de alimentos e bioenergia; […]

IV – responsabilidade comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em colaboração com a sociedade civil, na criação de políticas para a preservação e restauração da vegetação nativa e de suas funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais […]

VI – criação e mobilização de incentivos econômicos para fomentar a preservação e a recuperação da vegetação nativa e para promover o desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis.

Por isso, a responsabilidade ambiental deve ser considerada uma base ética e jurídica para ações sustentáveis, buscando minimizar os danos causados à natureza, no presente e no futuro, assim como buscar a reparação danos causados no passado. Não somente, a responsabilidade civil aplicada na consideração de reparação dos danos ambientais é a objetiva, como implica o jurista José Morato Leite:

No Brasil e em muitos outros países foi adotada, na área ambiental, a teoria da responsabilização objetiva, pelo risco criado e pela reparação integral. Entendem-se, por riscos criados, os produzidos por atividades e bens dos agentes que multiplicam, aumentam ou potencializam um dano ambiental. O risco criado tem lugar quando uma pessoa faz uso de mecanismos, instrumentos ou de meios que aumentam o perigo de dano. Nestas hipóteses, as pessoas que causaram dano, respondem pela lesão praticada, devido à criação de risco ou perigo, e não pela culpa.

A reparação integral significa que o dano ambiental deve ser recomposto na sua integridade, e não limitadamente, trazendo uma proteção mais efetiva ao bem ambiental. (LEITE, 1999, p. 119)

Apesar disso, a aplicação das determinações legais e a imputação de responsabilidade ainda não é uma prática consolidada.

A recorrência de casos danosos ao meio ambiente e a outros elementos que compõem a biodiversidade brasileira são evidentes, muito noticiados, mas pouco combatidos pelo poder público. Os casos de grilagem, desmatamento ilegal, a enorme quantidade de gases poluentes emitidos à atmosfera e a caça ilegal, por exemplo, são problemas enraizados culturalmente no mundo e que, mesmo com amparo da legislação brasileira, não são mitigados na prática.

Além do direito interno brasileiro, a falta de padrões internacionais estabelecidos e a ausência de consensos atrelados à diversas questões ambientais demonstram uma falha do sistema global em lidar com o dilema. Aqui, faz-se necessário considerar que as empresas, em sua maioria, operam em escala global, portanto ultrapassam as fronteiras das diretrizes legais nacionais.

Mesmo com a criação de comissões especializadas e atualização constante das leis para se adequarem às complexidades emergentes, é evidente a falta de progresso para um desenvolvimento econômico e social realmente sustentável. Principalmente quando se trata de países com grande potência econômica e amplo poder político, como os Estados Unidos, que é sede de uma série de multinacionais com filiais espalhadas pelo mundo, a fiscalização e efetiva aplicação de regras voltadas ao desenvolvimento sustentável fica dificultada.

De todo modo, as ocorrências danosas aos recursos brasileiros, quando muito alarmantes ou com grande repercussão social, movimentam os poderes públicos a se manifestarem em prol da defesa do meio ambiente. Neste tema, é jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DANOS DECORRENTES DE VAZAMENTO DE AMÔNIA NO RIO SERGIPE. ACIDENTE AMBIENTAL OCORRIDO EM OUTUBRO DE 2008.

  1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) para demonstração da legitimidade para vindicar indenização por dano ambiental que resultou na redução da pesca na área atingida, o registro de pescador profissional e a habilitação ao benefício do seguro-desemprego, durante o período de defeso, somados a outros elementos de prova que permitam o convencimento do magistrado acerca do exercício dessa atividade, são idôneos à sua comprovação; b) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar a sua obrigação de indenizar; c) é inadequado pretender conferir à reparação civil dos danos ambientais caráter punitivo imediato, pois a punição é função que incumbe ao direito penal e administrativo; d) em vista das circunstâncias específicas e homogeneidade dos efeitos do dano ambiental verificado no ecossistema do rio Sergipe – afetando significativamente, por cerca de seis meses, o volume pescado e a renda dos pescadores na região afetada -, sem que tenha sido dado amparo pela poluidora para mitigação dos danos morais experimentados e demonstrados por aqueles que extraem o sustento da pesca profissional, não se justifica, em sede de recurso especial, a revisão do quantum arbitrado, a título de compensação por danos morais, em R$ 3.000,00 (três mil reais); e) o dano material somente é indenizável mediante prova efetiva de sua ocorrência, não havendo falar em indenização por lucros cessantes dissociada do dano efetivamente demonstrado nos autos; assim, se durante o interregno em que foram experimentados os efeitos do dano ambiental houve o período de “defeso” – incidindo a proibição sobre toda atividade de pesca do lesado -, não há cogitar em indenização por lucros cessantes durante essa vedação; f) no caso concreto, os honorários advocatícios, fixados em 20% (vinte por cento) do valor da condenação arbitrada para o acidente – em atenção às características específicas da demanda e à ampla dilação probatória -, mostram-se adequados, não se justificando a revisão, em sede de recurso especial.
  2. Recursos especiais não providos.

(REsp n. 1.354.536/SE, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 26/3/2014, DJe de 5/5/2014.)

 

Em conclusão, a gestão ambiental assume um papel crucial no cenário atual, no qual a preservação dos recursos naturais e a sustentabilidade se tornam cada vez mais relevantes. As empresas que reconhecem essa importância e implementam práticas ambientalmente responsáveis não apenas contribuem para a proteção do meio ambiente, mas também podem colher diversos benefícios para seus negócios.

Para assegurar a eficiência da gestão empresarial em termos ambientais, é imperativo implementar práticas corporativas direcionadas a esse propósito. Alguns exemplos de medidas que podem ser adotadas são a instituição de uma gestão ambiental abrangente e eficaz, como a priorização de sistemas de transporte de baixo impacto ambiental, a promoção da conscientização entre colaboradores e consumidores, a adoção preferencial de fontes de energia limpas e renováveis, sempre que possível, e, claro, alinhar a atividade econômica organizada às determinações legais voltadas à proteção do meio ambiente.

É importante ressaltar que as práticas exigidas por lei não prejudicam a eficiência produtiva da empresa, uma vez que podem, inclusive, reduzir os custos operacionais por meio da adoção de estratégias de reutilização. Dessa forma, além de contribuir para a preservação ambiental, prevenir processos judiciais e a necessidade de reparos, as empresas podem colher benefícios diretos ao adotar medidas alinhadas com as práticas ambientais. Essa abordagem não apenas cumpre com as obrigações legais, mas também promove uma gestão responsável e sustentável, garantindo a prosperidade a longo prazo e a harmonia entre as atividades empresariais e o meio ambiente.

 

Referências:

LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 1999. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/30390108.pdf. Acesso em: 02 mar. 2024.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 02 mar. 2024

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm. Acesso em: 03 mar. 2024.

BRASIL. Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm. Acesso em: 03 mar. 2024

REsp n. 1.354.536/SE, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 26/3/2014, DJe de 5/5/2014

 

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