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ArtigosE-Commerce e Direito do Consumidor: Aplicações do CDC em Vendas Online

A disseminação dos direitos nas compras online ainda está em progresso, especialmente no ambiente da internet, onde muitos acreditam que não há regras e a justiça é ausente. No entanto, com o crescente volume de transações online, a jurisprudência está se adaptando para estabelecer normas e promover a conscientização sobre os direitos de cada consumidor ao realizar compras no ambiente virtual.

O consumo tem desempenhado um papel crucial na sociedade capitalista, incentivando uma relação mais harmoniosa entre fornecedores e consumidores. Nesse contexto, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) emerge como um aliado essencial nessa jornada, promovendo a defesa dos direitos dos consumidores. No contexto jurídico brasileiro, o CDC representa um conjunto de normas que garantem a proteção dos direitos do consumidor, regendo suas relações e estabelecendo responsabilidades, assim como delineando um padrão de conduta a ser seguido.

Com a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) no início do século XXI, houve um notável avanço na qualidade dos produtos oferecidos aos clientes, bem como uma relação mais respeitosa e ética com os consumidores, promovendo um consumo mais justo e gerando bem-estar. Em 2020, o CDC completou 30 anos, e ao longo desse período, foi possível observar as significativas mudanças e melhorias que sua implementação trouxe para o cotidiano dos brasileiros.

Assim, fica evidente que a efetivação de leis proporciona benefícios não apenas para os consumidores, mas também para os fornecedores, garantindo uma melhor qualidade e uma comercialização íntegra. Nesse sentido, quando se aborda a proteção e qualidade de serviço, principalmente no que desrespeita ao consumidor, a questão primordial que surge é se tais medidas são efetivamente implementadas na prática.

Conforme estabelecido pelo artigo 4º, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor é reconhecido como a parte mais vulnerável no mercado de consumo. Apesar dos esforços incessantes do direito em garantir igualdade para todas as partes, nem sempre é viável alcançar esse equilíbrio de forma plena. Por esse motivo, é fundamental dispor de ferramentas que assegurem que o lado mais vulnerável possa alcançar condições de equilíbrio e proteção adequadas.

Quando a relação de consumo é resguardada pelo CDC, qualquer dano resultante dessa relação acarreta em responsabilidade civil. Segundo o autor Silva:

(…) é possível dizer que o Código de Defesa do Consumidor trouxe a lume uma nova área da responsabilidade civil – a responsabilidade nas relações de consumo, tão vasta que não haveria nenhum exagero em dizer estar hoje à responsabilidade civil dividida em duas partes: a responsabilidade tradicional e a responsabilidade nas relações de consumo. (FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed., São Paulo: Atlas, 2012, p.18).

 

No que desrespeita à responsabilidade do Estado nas relações de consumo, no contexto do direito brasileiro, o ponto central sempre será a Constituição da República Federativa do Brasil, uma vez que é a partir dela que as demais áreas do direito, tanto público quanto privado, se moldam. Observa-se que a Constituição Federal aborda a responsabilidade civil das pessoas jurídicas, tanto no âmbito público quanto no privado, que prestam serviços públicos, sendo responsáveis, de forma dolosa ou culposa, pelos danos causados. Essa responsabilidade civil, por sua vez, se estende para outros ramos do direito, como o trabalhista, civil e, não menos importante, para o direito do consumidor.

Apesar das controvérsias sobre a autenticidade e a efetividade da aplicação da lei em favor da proteção ao consumidor, o CDC tem como objetivo primordial atender às demandas dos consumidores e tudo o que envolve seus interesses. Um exemplo significativo e contínuo de proteção ao consumidor é o combate à publicidade enganosa e abusiva, que frequentemente cria expectativas falsas ou promove produtos inexistentes.

Em se tratando das relações de consumo no ambiente virtual, é certo dizer que o comércio eletrônico compartilha as mesmas funções de uma loja física, ambas destinadas à venda de produtos. No entanto, é evidente que existem algumas diferenças entre elas, começando pela forma de comunicação. Nas lojas físicas, é possível interagir diretamente com uma pessoa e examinar o produto pessoalmente, enquanto no comércio eletrônico, o atendimento é virtual e o produto só é recebido após a data estabelecida na compra.

Inúmeras empresas têm alterado sua forma de comercialização ou mesmo ampliado seu alcance para os conhecidos e-commerces. Essas plataformas digitais estão ganhando considerável espaço devido à facilidade de expansão e ao alcance do público-alvo. É sabido que hoje, tudo o que é publicado, pesquisado e adquirido na internet vai moldando um perfil de consumo e distribuição de conteúdo totalmente personalizado para os interesses individuais, filtrando o que é relevante e o que não é para cada indivíduo.

Um exemplo dessa proliferação do cenário virtual como espaço de transações comerciais é o marketing digital, que está intimamente ligado ao comércio eletrônico. Esse campo abriu um vasto leque de possibilidades para a divulgação de produtos e para a modelagem de estratégias de venda, atraindo assim um público significativamente maior. Em suma, podemos afirmar que o comércio eletrônico é uma inovação permanente, destinada a simplificar, ampliar e diversificar o mercado.

A credibilidade do mercado digital também aumentou com a entrada de marcas de renome, que anteriormente, por receio do desconhecido, hesitavam em se aventurar no comércio eletrônico. A Amazon, por exemplo, uma empresa reconhecida globalmente, está presente no e-commerce desde 1990. Ao longo do tempo, ela cresceu gradualmente, estabelecendo um mercado confiável com seus clientes e se tornando uma das maiores empresas do mundo nos últimos anos.

Essa credibilidade também foi fortalecida pelo que podemos considerar o fator mais crucial: a responsabilidade civil e a proteção dos dados e da privacidade online, aspectos de extrema importância para conquistar a confiança de pessoas mais conservadoras nesse novo meio de compra.

Essa credibilidade e a conquista de espaço no mercado competitivo são atribuídas à responsabilidade civil e à proteção de dados, as quais estão associadas ao Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014). Este marco representou um avanço significativo ao estabelecer responsabilidades das plataformas digitais por danos causados por terceiros. Além disso, promoveu a liberdade de expressão em um ambiente antes conhecido como “terra de ninguém”, sendo um momento crucial para a consolidação dos princípios de justiça.

Por conseguinte, embora a proteção de dados esteja contemplada no Marco Civil, a extrema importância desse aspecto levou à criação de uma lei dedicada exclusivamente a ele, a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) (Lei nº 13.709/2018), que estabelece:

dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, como objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. (Brasil, 2018, Artigo 1).

 

Aqueles que acreditam que a internet ainda carece de justiça ou leis estão enganados. No Brasil, os usuários do comércio online devem obedecer às diretrizes do Código de Defesa do Consumidor e, de fato, acatar o Decreto nº 7.962/2013, que é específico para o comércio eletrônico.

Embora seja reconhecida a aplicabilidade da legislação atual neste comércio, é sabido que muitos temas abordados no CDC são impraticáveis no comércio eletrônico, evidenciando a necessidade de se desenvolver uma legislação específica e abrangente para abordar questões virtuais. A educação do consumidor desempenha um papel fundamental, permitindo que, ao procurar por produtos online, esteja ciente de seus direitos e responsabilidades. Ao compreender o respaldo jurídico disponível, a experiência do consumidor no mundo virtual se torna mais satisfatória e eficaz.

Em 2013, o Decreto 7.962, embora limitado por sua ligação com o CDC, representou um avanço significativo para o e-commerce. É reconhecido que, quando a sociedade passa por mudanças, as leis devem evoluir para acompanhar tais transformações, mas a burocracia muitas vezes retarda esse processo de atualização. Portanto, mesmo reconhecendo a necessidade de uma legislação mais abrangente e detalhada sobre o assunto, o Decreto foi um marco importante para o comércio virtual. Alguns desses significativos avanços podem ser observados:

Art. 1º Este Decreto regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico, abrangendo os seguintes aspectos:

I – informações claras a respeito do produto, serviço e do fornecedor;

II – atendimento facilitado ao consumidor; e

III – respeito ao direito de arrependimento.

 

Dessa forma, as informações relacionadas ao produto devem ser claras, conforme estipulado pelo Código de Defesa do Consumidor, que embora não aborde especificamente as vendas online, trata da venda do produto em geral. É necessário que os produtos incluam o valor específico de sua oferta, bem como as opções de pagamento, disponibilidade em estoque e prazo de entrega.

No que diz respeito ao preço, a informação transmitida ao consumidor deve ser tão clara quanto possível, incluindo a forma de pagamento, o valor à vista do produto ou serviço, o preço total do produto e quaisquer alterações de preço no caso de parcelamento (se aplicável). Além disso, o prazo de entrega é um dos requisitos estabelecidos; a empresa deve fornecer informações sobre o tempo estimado para a entrega do produto, mesmo que ela terceirize esse serviço de entrega.

Na maioria das vezes, as transações de compra e venda pela internet são intermediadas por um contrato, o qual é mais comum nos contratos de serviços. Esses contratos devem oferecer ao cliente a opção de cancelamento dentro de um prazo predefinido. Em grande parte dos casos, as empresas não cobram taxas de cancelamento se o serviço for interrompido dentro do período de 7 (sete) dias corridos. Essa medida está prevista no Código de Defesa do Consumidor, mais especificamente em seu artigo 49, que estipula:

“Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio”.

 

Com a promulgação desse Decreto, foi vital implementar efetivamente essas medidas, o que abalou um pouco aqueles que operavam de forma irregular. No entanto, isso gerou uma maior credibilidade para aqueles que eram cautelosos em relação aos serviços oferecidos pela internet.

Com a pandemia causada pelo Covid-19 (coronavírus), houve um aumento significativo na tendência de compra de produtos de diversos tipos em todo o país. Como resultado, os índices de reclamações nos órgãos responsáveis por essa fiscalização, como o PROCON, também aumentaram. No estado de São Paulo, por exemplo, no primeiro mês de isolamento social, as denúncias e reclamações aumentaram em 70%, de acordo com os dados do PROCON-SP. É importante ressaltar que essa busca por serviços e produtos online foi uma consequência do isolamento social imposto por vários estados do país.

Por todo o exposto,  é certo afirmar que a responsabilidade civil nas relações consumeristas, conforme estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor, deve ser objetiva. Além desse tema, observa-se um aumento significativo na demanda e na procura por serviços online, especialmente devido ao cenário atual da COVID-19, que impactou o mundo inteiro. Conclui-se que o sistema judiciário brasileiro deve direcionar sua atenção para esse novo espaço, considerando tanto uma adaptação interna para acompanhar esse crescimento quanto a implementação de inovações na legislação do mundo virtual para abranger sua real dimensão.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

AFFONSO, Carlos, Direito do Consumidor: Novas Tendências e Perspectiva Comparada, Editora Singular, 2020.

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2010.

BOLZAN, Fabrício, Direito do Consumidor Esquematizado, 8ª Edição. Editora Saraiva, 2020.

DENSA, Roberta, Código de Defesa do Consumidor, 2ª Edição, Editora Foco, 2019.

GABRIEL, João, E-book, Direito do Consumidor: Coleção Carreiras Jurídicas, 1° Edição. Editora CP Iuris, 2020

MAIOLINO, Isabela; TIMM, Luciano Benetti (Orgs). Direito do consumidor: novas tendências e perspectiva comparada. Brasília: Editora Singular, 2019.

PALLEGRINI, Ada, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 11ª Edição, Editora Forense, 2017.

STOLZE, Pablo, Novo curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil 3, 14ª Edição. Editora Saraiva, 2016.

TARTUCE, Flávio; AMORIM Daniel, Manual de Direito do Consumidor, Direito Material e Processual, Vol. Único. 7ª Edição. Editora Método, 2018

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