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ArtigosO Direito Autoral das obras audiovisuais

As obras audiovisuais fazem parte do cotiado da maioria da sociedade, seja por meio de filmes, séries, vídeos ou novelas. São compreendidas por expressões artísticas compostas por elementos visuais e sonoros.

Por lei, são protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio, como os textos e obras literários, artísticas ou cientificas e as obras audiovisuais, conforme o artigo 7º da lei do direito autoral:

 

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro

 

Somente em 2021, as obras audiovisuais arrecadaram cerca de 26,7 bilhões de reais a economia do Brasil. Segundo a ANCINE, o avanço na composição do valor gerado pelo setor se deve ao desenvolvimento de novas tecnologias, que tornaram a  fruição dos produtos audiovisuais mais acessíveis ao público em geral.

A criação dessa vertente artística envolve diversos profissionais para a elaboração do roteiro, aplicação de efeitos, direção e suporte para gravação, entre outras tarefas. Nesse universo artístico, é complexo compreender a quem pertencem os direitos autorais da obra final.

Dessa forma, visando impulsionar a criação da arte, o Estado protege e regula os direitos dos autores e suas criações por meio da lei 9610/98. O legislador teve o cuidado de não limitar o direito autoral ao registro da obra, pois facilitaria a prática do plágio.

A proteção dos direitos autorais das obras audiovisuais, pendurará por 70 anos, contados a partir do ano subsequente a sua divulgação, conforme dispõe a lei  do direito autoral: “ Art. 44. O prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras audiovisuais e fotográficas será de setenta anos, a contar de 1° de janeiro do ano subsequente ao de sua divulgação.”.

Os direitos autorais são divididos entre direito moral e patrimonial, sendo o primeiro inalienável. Os direitos morais protegem principalmente  a imagem do autor e da obra, além disso resguarda contra  fraudes, danos a obra, entre outros atos lesivos aos autores.

 

Art. 24. São direitos morais do autor:

I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;

II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;

III – o de conservar a obra inédita;

IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;

V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;

VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem;

 

Por outro lado, os direitos patrimoniais garantem o direito de comercialização da obra. Assim, conferem a percepção de valores quando a obra se torna mais valiosa, a possibilidade de cessão, licenciamento, ou seja, a fruição plena de sua invenção. O objetivo é que o artista tenha seu reconhecimento financeiro sobre a obra, mesmo após vendida, cedida ou licenciada.

 

Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades

 

Todos os autores que compõem uma obra possui direitos sobre ela. Conforme a Lei do direito autoral, in verbis, os autores e diretores envolvidos na criação de uma obra audiovisual serão considerados como coautores, ou seja, ambos detém direitos.

 

Art. 16. São co-autores da obra audiovisual o autor do assunto ou argumento literário, musical ou lítero-musical e o diretor.

Parágrafo único. Consideram-se co-autores de desenhos animados os que criam os desenhos utilizados na obra audiovisual.

 

Entretanto, a lei traz uma diferencial quanto ao exercício dos direitos  das obras audiovisuais. Conforme explicitado, a obra é desenvolvida por diversos autores e por isso o exercício dos direitos morais se dará de forma diferente das demais obras.

Dessa forma, de acordo com o art. 25 da referida lei, caberá exclusivamente ao diretor da obra audiovisual o exercício dos direitos morais sobre ela. Em contrapartida, caberá aos coautores decidirem quanto aos direitos patrimoniais das obras.

Importante frisar que as decisões sobre o direito patrimonial da obra devem ser tomadas em conjunto e quando houver divergência entre os coautores a decisão será tomada por sua maioria.

 

Art. 32. Quando uma obra feita em regime de co-autoria não for divisível, nenhum dos co-autores, sob pena de responder por perdas e danos, poderá, sem consentimento dos demais, publicá-la ou autorizar-lhe a publicação, salvo na coleção de suas obras completas.

1º Havendo divergência, os co-autores decidirão por maioria

2º Ao co-autor dissidente é assegurado o direito de não contribuir para as despesas de publicação, renunciando a sua parte nos lucros, e o de vedar que se inscreva seu nome na obra.

3º Cada co-autor pode, individualmente, sem aquiescência dos outros, registrar a obra e defender os próprios direitos contra terceiros.

 

Não obstante, embora a lei confira ao diretor os direitos morais sobre a obra, não retira dos coautores a prerrogativa de protegerem seus direitos contra terceiros que a utilizarem de forma indevida.

Assim, quando vislumbrado a possibilidade de ganhos patrimoniais, é necessário prévia autorização dos  coautores para utilização da obra, devido ao direito de coautoria. A utilização da obra independente de conhecimento de todos os coautores será capaz de causar danos aos que não foram previamente consultados.

Nesse sentido, é possível observar que os direitos autorais são complementares entre si. A parte que versa sobre o direito moral, exercida pelo diretor, deverá caminhar em conjunto com o direito patrimonial, exercido pelos coautores, pois caso a moral da obra seja afetada, consequentemente o patrimônio desta também será.

Entretanto, é importante mencionar que a coautoria não exclui o direito moral individual do autor em uma obra, ou seja, caso haja lesão aos direitos morais, poderá buscar reparação, mesmo que não seja o diretor da obra, esse é o entendimento do STJ, no caso da novela Pantanal:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. REEXIBIÇÃO DA TELENOVELA “PANTANAL”. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. DANOS MATERIAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS SOBRE DIREITOS AUTORAIS. ALEGADA OFENSA AO ART. 3º DA LEI Nº 5.988/73 (ATUAL ART. 4º DA LEI Nº 9.610/98). INOCORRÊNCIA. RENÚNCIA EXPRESSA. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. OFENSA AO ART. 24, IV, DA LEI Nº 9.610/98 RECONHECIDA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

(…)

. 4. Na análise do dano moral incide a Lei nº 9.610/98 e o CC/02, uma vez que o fato gerador, a retransmissão da telenovela, ocorreu entre 9/6/2008 e 13/1/2009, na vigência desses diplomas legais. 5. A renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra do autor não pode ser extensível aos direitos de personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. Inteligência do art. 24, IV, da Lei nº 9.610/98 e do art. 6 bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Decreto nº 75.699/75). 6. A garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou desrespeito às características que identificam. Na hipótese dos autos, os danos morais são devidos uma vez que os cortes de cenas e supressões de diálogos na telenovela “Pantanal” atingiram a honra e a reputação do autor. 7. Recurso especial provido em parte.

(STJ – REsp: 1558683 SP 2015/0253997-2, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 15/09/2016, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2016 RT vol. 975 p. 500)

 

A famosa novela dos anos 90, Pantanal, está sendo refilmada, sem perder o enredo cativante,  que explora as belezas do Pantanal.  Entretanto, a dramaturgia das nove, que ganhou espaço nas telinhas, traz consigo uma disputa judicial a respeito do direito autoral da obra.

O enredo é fruto de uma obra artística impecável do escritor Benedito Ruy Barbosa, famoso por suas novelas. Essa, em especial, foi criada para a extinta TV Manchete e se tornou um sucesso em sua primeira versão.

Tempos depois a TV Manchete faliu e  foi comprada pelo SBT. Então, em 2008, o SBT decidiu reprisar Pantanal, pois a gravação da novela estava dentre os pertences da massa falida da TV Manchete.

O resultado foi um processo milionário movido por Benedito Ruy Barbosa contra o SBT, pois escritor da novela havia estabelecido com a extinta TV manchete um contrato para utilização do texto com prazo de 10 anos, que se encerrou em 2000.

Entre os pedidos do autor, estava a suspensão da reapresentação da obra, bem como o pagamento de indenização por danos morais e patrimoniais. Os danos morais seriam em razão dos cortes sofridos na novela durante a reexibição. O processo foi julgado parcialmente procedente.

O autor saiu vencedor no tocante aos direitos morais oriundos dos cortes sofridos durante a reexibição. Os cortes são capazes de ferir a honra do autor, famoso por seus trabalhos, e fazer com que os telespectadores tenham uma imagem negativa sobre sua obra.

Observe que mesmo existindo o direito de coautoria, ainda há um aspecto individual que garante o direito individual do autor. Embora caiba ao diretor, no caso a extinta TV Manchete, os direitos morais sobre a obra, inclusive a autorização para reprise, quando vislumbrado a possibilidade de danos ao direito moral individual do autor, este poderá buscar resguardar-se.

Sendo assim, tem-se que os direitos autorais das obras audiovisuais são bastante complexos, pois envolvem diversos criadores, em razão disso, cada caso sempre abrangerá uma problemática diferente.

Além disso, embora caiba ao diretor da obra audiovisual exercer seus direitos morais, não poderá exercer de forma autônoma os direitos patrimoniais, cabendo a ele na verdade, ser o guardião moral da obra.

Além disso, percebe-se que a fruição do direito moral por parte do diretor da obra é limitada, ou seja, precisa ser usufruída de forma prudente, sempre atenta aos direitos  morais individuais dos coautores.

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BRASIL. Lei nº 9279/96, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial.  Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9279.htm. Acesso em 11 de junho de 2022.

BRASIL. Lei nº 9610/98, de 19 de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências.  Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9279.htm. Acesso em 11 de junho de 2022

GOVERNO FEDERAL, ANCINE. Audiovisual brasileiro gerou R$ 26,7 bilhões à economia do País, Brasília, 23 de novembro de 2020. Disponível em: https://www.gov.br/ancine/pt-br/assuntos/noticias/audiovisual-brasileiro-gerou-r-26-7-bilhoes-a-economia-do-pais. Acesso em: 11 de junho de 2022

STJ – REsp: 1558683 SP 2015/0253997-2, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 15/09/2016, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2016 RT vol. 975 p. 500

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